VESTIDO DE NOIVA: UM RITO DE PASSAGEM

O casamento religioso sempre foi incentivado pela Igreja. No entanto, no Brasil Colonial, prevalecia o concubinato. Motivo? Era uma cerimônia no qual somente a elite poderia pagar. Este quadro não se alterou muito no Império e início da República. Porém, o regime republicano excluiu a hegemonia do casamento religioso, instituindo a obrigatoriedade do casamento civil. A cerimônia religiosa passou desde então a ser facultativa, não mais criando precedentes legais, como outrora. Não obstante a Igreja ter perdido a égide legal sobre o matrimônio, na prática, a cerimônia religiosa não foi abandonada e até hoje está inserida na cultura nacional. Quem imagina que a pós-modernidade tenha minimizado a importância do casamento religioso no imaginário feminino, mesmo entre aquelas mais “moderninhas”, engana-se. As mulheres não deixaram de casar-se na igreja, ainda que já dividissem há tempos o leito conjugal com o seu parceiro.
Nesta entrevista realizada com Marilda Lima Berbert, que faz ornamentos de noivas a 47 anos em Friburgo, conheceremos este universo ainda cercado de romantismo, apesar da mudança comportamental. Mudanças houve muitas, mas a permanência das tradições ainda é a tônica, com movimentos cíclicos que ora incluem, ora excluem alguns elementos simbólicos, a exemplo das daminhas e dos bonecos representando os noivos no último andar do bolo, que entram e saem de moda frequentemente. Estes elementos simbólicos são excluídos e retornam ao longo do tempo, atendendo sempre aos modismos.

Marilda já está na terceira geração de noivas. Faz chapéus, tiaras - outrora denominadas de grinalda -, apliques, véus, mantilhas e bouquets para as netas de suas clientes no passado. Como era uma noiva na década de 60? Segundo ela, o fato das noivas se casarem virgens interferia nos elementos simbólicos do casamento. Tinha que ser um vestido muito coberto, sem decote e transparência. A cor traduzia o símbolo da virgindade. Tudo deveria ser branco e nada de tons coloridos. O branco simbolizava a pureza da noiva. As cabeças eram floridas com miosótis, margaridinhas, gipse, miguês, rosinhas, mas todas flores artificiais. Os véus eram imensos, muitas vezes com oito metros de comprimento. Na Catedral São João Batista, os véus arrastavam-se desde o altar até a porta da igreja. Mas aos poucos foram ficando mais leves, porém, sua evolução foi lenta. Veio a década das pérolas. Todas as noivas usavam colar, ornamento de cabeça e bouquets de pérolas. Era muito comum ainda o uso de uma jóia de família pela noiva. Mas qual foi o momento de maior ruptura nas tradições do casamento? De acordo com Marilda foi a década de oitenta. Desaparece o delicado, o romantismo. Os acessórios mudam completamente. As noivas já querem ornamentos coloridos, em tons como lilás, amarelo, rosa e azul. Ocorreu ainda a introdução de flores naturais junto às artificiais, misturando-se hortênsia, angélica, lírio, livianto, agapanto, orquídea, a flor de laranjeira e a rosa. Esta última, nunca poderia faltar em uma noiva tradicional. A flor de laranjeira era usada na cabeça, no bouquet e na lapela do noivo. Mas qual é a diferença entre uma noiva do passado e do presente? Marilda responde que é a atitude. Perderam um pouco romantismo e tornaram-se mais práticas e objetivas. Não querem mais um adorno exclusivo. Preferem alugar. Não porque não pudessem pagar, mas porque acham mais prático. Véus, chapéus e tiaras são alugados e Marilda assim o fez para adaptar-se a esta praticidade das noivas. Mas os ornamentos não perderam a sua qualidade, já que utiliza cristais swarowiski, flores naturais de Holambra, renda francesa e voalette. Marilda nos informa outra mudança significativa: o casamento no mês de maio é mito. As noivas preferem casar-se no início da primavera. Motivo? A estação é melhor para os modelos das roupas da família e dos padrinhos.
E o que não mudou? O próprio casamento em si. Não deixaram de casar. Mesmo viúvas ou divorciadas voltam a casar-se com todos os ritos do tradicional casamento de “véu e grinalda”. Histórias não faltam. Uma noiva enviuvou duas vezes e casou-se pela terceira vez na igreja, com pompa e circunstância. Uma antiga cliente do tipo despojada, quando casou a filha, quis esta adornos mais tradicionais, diferentemente da mãe, que fazia o tipo hippie. No território do casamento, tudo é muito cíclico. Em determinado momento, na década de 80, as daminhas de companhia e pajens desaparecem e o véu fica ultrapassado. No entanto, voltaram com força nos últimos anos. De acordo com Marilda, o vestido de noiva nunca esteve tão em voga.


Então pergunto: em meio a tanta modernidade e liberalidade no comportamento atual das mulheres, até quando necessitarão elas do vestido de noiva, deste rito de passagem, para viverem felizes para sempre?
Fonte: Entrevista com Marilda Lima Berbert, realizada em 05\01\2010. Há 47 anos faz adornos de noivas.

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