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PASSAGEM DE NOEL ROSA POR NOVA FRIBURGO




Esse ano se comemora o centenário do nascimento do grande compositor carioca Noel Rosa, nascido em 11 de dezembro de 1910, no Rio de Janeiro. Nada mais oportuno falar de Noel Rosa nesse momento em que passa o Rio Janeiro, onde as elites cariocas finalmente derrubam os muros da “cidade partida”, como definiu Zuenir Ventura, e o poder público volta sua atenção às comunidades das classes populares do Rio Janeiro. Noel Rosa já se antecipara nessa vinculação entre o asfalto e o morro. Nunca aceitou essas fronteiras e sempre fez uma ponte entre a classe média carioca, no qual era originário, e os compositores dos “morros” (comunidades) do Rio de Janeiro. Era fascinado pela figura do “malandro do morro” que nada se assemelha aos atuais bandidos cariocas. O que hoje as elites querem resgatar, Noel o fez há quase um século atrás.


Noel Rosa ingressou no curso de medicina mas a boemia falava mais forte em sua vida, levando-o a abandonar o curso. Franzino e debilitado desde muito cedo, sua mãe ficava sempre preocupada com o filho que vivia nas noites cariocas. Sabendo, certa vez, que Noel iria à uma festa, escondeu todas as suas roupas. Quando seus amigos chegaram para apanhá-lo, Noel grita, de seu quarto: "Com que roupa?". No mesmo instante a inspiração para seu primeiro grande sucesso, gravado no carnaval de 1931, onde vendeu 15000 discos.

Tímido e recatado, Noel relaxava bebendo e compondo. A polícia, à época, prendia o sujeito que tinha calo nos dedos de tocar violão, pois o considerava um “vagabundo”. Sempre sem dinheiro, suas composições lhe rendiam apenas alguns parcos tostões e o pouco que recebia gastava tudo na boemia com as mulheres e com a bebida. Sua vida desregrada acabou lhe gerando uma tuberculose. Há o relato de que quando já apresentava um quadro clínico de tuberculose avançada e proibido de beber sem comer alguma coisa, um amigo o encontrou em um bar tomando cerveja e caçhaça e o recriminou, ao que ele respondeu: “Dizem que cerveja alimenta e eu como não posso beber sem comer, eu como cerveja e bebo cachaça.” E foi devido a tuberculose que contraíra que Nova Friburgo entra em um difícil momento de sua vida.

Há relatos de que Noel Rosa se tratou em Nova Friburgo. Era natural. Nova Friburgo era considerada a “cidade sanatório” para onde afluíam, devido a salubridade de seu clima, muitos doentes vítimas da tuberculose. A proximidade com o Rio de Janeiro aumentava ainda mais o número de pessoas que buscavam o muncípio para se convalescer dessa temível doença. Ao contrário do que ocorrera no passado, no início do século 20, os bons hotéis da cidade já não aceitavam hospedar pessoas doentes de tuberculose. Nova Friburgo recebia tantos tísicos que já assustava os veranistas que se hospedavam nos hotéis, pois a doença era contagiosa. A recepção desses tuberculosos ficava a cargo das inúmeras pensões que havia na cidade. O Sanatório Santa Terezinha, no Catarcione, seria inaugurado somente na década de 40, do século 20 e o Sanatório Naval apenas recebia militares da Marinha. Há referência de que Noel Rosa alugou uma casa em Nova Friburgo. Consequentemente, pode ter permanecido por alguns meses. Noel Rosa deve ter estado em Friburgo entre 1930 e 1936 para se curar da tuberculose. Há quem afirme que a música “O Orvalho Vem Caindo” tenha sido composta em Nova Friburgo por Noel enquanto se convalescia. A letra e a melodia triste de fato nos remetem a Friburgo nesse período de sua vida, que diz: “O orvalho vem caindo, vai molhar o meu chapéu/ e também vão sumindo, as estrelas lá do céu/ Tenho passado tão mal(...)A minha sopa não tem osso e nem tem sal/Se um dia passo bem, dois e três passo mal.”

Mas como provar que Noel Rosa esteve em Nova Friburgo? Infelizmente, os jornais da época, que devem ter registrado sua passagem por aqui, não estão disponíveis para consulta no Centro de Documentação da Prefeitura. No entanto, Derly Moreira Chlaloub, nascida em 1921, nos informa que sua mãe contava que via Noel Rosa na Praça Getúlio Vargas. Sentado no banco, cuspia constantemente no chão, uma postura típica dos tuberculosos. Noel, habituado a boemia nas rodas de samba, o autor de “Conversa de Botequim”, onde explora a sociabilidade carioca, deve ter achado entediante sua passagem pela modorrenta Nova Friburgo. Nessa ocasião, Friburgo tinha uma influência muito forte da cultura alemã, sendo que os industriais alemães, por conta das indústrias de grande porte que por aqui se instalaram, implementaram uma cultura baseada na disciplina no cotidiano da cidade. O comportamento dos friburguenses em nada se assemelhava a camaradagem fácil da boemia carioca que tanto atraíra Noel. Falecido no Rio de Janeiro, em 04 de maio de 1937, aos 26 anos, vitimado pela tuberculose, deixou um legado de mais de duzentas músicas onde a tônica de sua obra foi o cotidiano do carioca e a crítica social. O trovador friburguense José Nogueira, o Bieca, registrou a passagem de Noel Rosa por Nova Friburgo. Em suas trovas sobre Friburgo na década de quarenta, do século 20, escreveu: “Friburgo que Rui Barbosa aplaudiu quando chegou, Friburgo que Noel Rosa, no seu coração guardou”.

Monumento dedicado a Noel Rosa, em Vila Isabel, no Rio de Janeiro




O cotidiano de uma típica família italiana em Nova Friburgo

Yolanda Brugnolo Lívio Barilari Bizi Cavalieri d´Oro é descendente de imigrantes italianos que vieram para Friburgo, no final do século XIX. Conheceremos a vida de sua avó Anita, para entender um pouco do cotidiano destes italianos em Friburgo, na década de 20, do século XX. Anita foi uma guerreira. Viúva aos 24 anos, com três filhos pequenos, Carmem, Elisa e Dante e um na barriga, que morreu ainda bebê, conseguiu vencer todas as dificuldades e criar seus filhos sozinha. O italiano Bonaventura, marido de Anita, tinha uma loja de calçados e gostava muito de beber Chianti e jogar bocha com os patrícios, os amigos italianos Mastrangelo, Perna, Piloto e Caputo. No entanto, em visita a um amigo no Rio de Janeiro, doente com febre amarela, contraiu a doença e faleceu prematuramente. Anita, uma das mulheres mais bonitas da época, loura e pele de alabastro, não quis casar-se outra vez, apesar de não lhe faltar pretendentes. Anita “encostou na máquina de costura” e com esforço organizou um atelier, contratando costureiras e conquistando uma clientela sofisticada. Recorda-se Yolanda que “a Nova Friburgo daquela época era muito sofisticada. A colonização suíça e alemã, a vinda de veranistas franceses, e mesmo aristocratas do Rio de Janeiro, trazia hábitos finos, gostos cultivados. Vovó Anita era uma mulher pobre, mas de fina educação, adquirida nas casas requintadas que freqüentava, primeira como costureira, logo como amiga.”

Anita abrigou em sua casa muitas sobrinhas para livrá-las dos rudes trabalhos da lavoura e igualmente as educou. Todas tinham que trabalhar, sem tugir nem mugir. Aprenderam muito e lhe são gratas mesmo quando recordam a ligeireza da mão da velha Anita, quando distribuía corretivos. Aos poucos, alguns italianos foram se mudando para Friburgo, deixando o trabalho do campo. Yolanda se recorda do delicioso almoço de ovo frito com polenta e mortadela, feitos no fogão de lenha crepitante, em casa de seus parentes italianos. Lembra-se ainda, da época em que inauguraram em Friburgo a Casa d’Itália, onde ouvia palestras sobre Dante, Sanzio, Cellini, Leonardo da Vinci e bem assim dos bailes do Club Dopo Lavoro. Numa parte do salão, a moçada sambava e fazia cordões, enquanto que no outro, a “italianada velha”, os Mastrangelo, Caputo, Perna, Massa e Bianchini, dançavam alegremente a tarantela.


Como havia muitos tuberculosos na cidade, sua avó Anita abriu uma pensão para atender a estes doentes que vinham se curar em Friburgo. Bom negócio e clientela certa, pois chegavam frequentemente centenas de tuberculosos a cada ano em Friburgo, pois o clima lhes era favorável à cura. Anita possuía uma série de cuidados especiais com seus hóspedes doentes e segurava as bacias para as hemoptises dos tísicos, todos muitos “fracos de peito”. Yolanda se recorda de sua avó dando ao doente uma gema crua numa colher de sopa para criar cor, seguida de um cálice de vinho do Porto ou um escalda pés capaz de afugentar qualquer resfriado teimoso. Chegava o domingo, dia da sacrossanta macarronada. Desde cedinho, sua avó mesmo pronta para a missa, usava um avental de algodão alvejado para preparar a massa de trigo e ovos. Enquanto Anita ia a missa, a massa ficava esticada na mesa, secando, e o delicioso molho apurando no fogão de lenha. A pasta era servida numa travessa de porcelana, acompanhada por uma dourada carne assada, cortada em fatias com batatas em sua volta.

Finalmente, se recorda de sua avó vigiando-a pela janela, enquanto brincava na rua, pois “quem toma conta, dá conta”. Yolanda, na sua velhice, se surpreendia consigo mesma cantando velhas cantigas italianas e em suas memórias, disse que parecia ainda sentir o cheiro dos rapapés, pudins, bolos, queijos, biscoitinhos de polvilho, licores de jabuticaba e vinhos de laranja, tudo feito pelas mãos mágicas de sua avó Anita.
Fonte: Baseado nas memórias de Yolanda Brugnolo Lívio Barilari Bizi Cavalieri d´Oro(1922-2007)

As furiosas Bandas de Música

Banda de Música do Século XIX


Prática cultural presente no cotidiano da cidade, é difícil imaginar um evento em Nova Friburgo, no final do século XIX, que não tivesse a presença das bandas de música tocando retretas, polcas, mazurcas e schottisches. Muito diferentes das bandas de hoje, que se limitam à execução em espaços fixos, as bandas de outrora tinham mobilidade, circulavam pelas ruas da cidade e participavam desde acontecimentos mais importantes, como datas cívicas, até os mais simplórios.

A passeio percorriam as bandas tocando dobrados e retretas pelas ruas da cidade, principalmente aos domingos. Estavam presentes nos momentos de alegria, como celebrações de casamentos, aniversários, homenagens, leilões, circos, passeios campestres, procissões religiosas, carnaval, teatro e soirées, como também nos de tristeza, como no caso dos funerais. Nos acontecimentos mais banais da cidade, lá estava a banda de música, seguindo o cortejo, sempre pontuando os acontecimentos, sempre presente nas sociabilidades.

Das soirées mais elegantes como no mais popular dos bailes, não havia um momento em que não houvesse a presença das “furiosas” abrilhantando o evento. Eram prestigiadas por todas as classes sociais, ao contrário do que ocorre atualmente em Nova Friburgo, onde são consideradas como algo miquelino, um divertimento próprio para as classes populares.Seus estandartes eram benzidos pelo cônego da cidade.

A banda de música é uma prática cultural herdada da colonização portuguesa. A charamela foi um instrumento europeu trazido por portugueses muito utilizado pelos escravos – os escravos charameleiros –, que formavam geralmente ternos e quaternos de charamelas, agrupamentos muito comuns em Portugal no século XVII e que se multiplicaram pelas fazendas e vilas do interior do Brasil. Tudo indica que aqui os conjuntos de charameleiros negros foram os antecessores das bandas de música tal como a conhecemos hoje. Manter um conjunto musical era, para os fidalgos, sinal de abastança e bom-tom, à maneira das cortes européias. Há ainda a referência às antigas bandas de barbeiros, formadas por africanos libertos.


No Brasil-Colônia, fazendeiros mantinham bandas formadas por escravos para entreter seus convidados, sendo considerado um indício de civilidade do anfitrião. Não foi ao acaso que o barão de Nova Friburgo foi o primeiro patrono e mecenas da Sociedade Musical Euterpe. O imigrante português parece ter sido o principal responsável pelo estabelecimento da tradição das bandas no Brasil. Mas os italianos participaram igualmente de maneira decisiva na formação musical do país, havendo entre esses imigrantes, vindos para trabalhar na lavoura do café, em São Paulo, expressivo número de músicos instrumentistas e regentes que se ligaram às bandas de música.
O grande afluxo de músicos italianos para as bandas teria provocado uma mudança no repertório habitual até então executado nas retretas das praças públicas.Trechos de óperas italianas, com suas árias, duetos, cavatinas, fantasias, entre outros, tornaram-se os gêneros de preferência das bandas que os abrigaram. Cavatina é uma peça vocal sem repetição “da capo”, de menor vôo lírico do que a ária. Geralmente é precedida de um recitativo e comporta a repetição. Os alemães também tiveram tradição em bandas e influenciaram no surgimento de algumas delas no Brasil. Os italianos se abrigaram na Sociedade Musical Campesina, e é provável que a animosidade entre essa banda e a Euterpe, de origem portuguesa, seja mais em função de dissensões entre nacionalidades do que políticas. Em Friburgo, apesar de a presença de alemães ter sido diminuta, esses imigrantes influenciaram na formação da Sociedade Musical Lumiarense.

No final do século XIX, havia quatro sociedades musicais no perímetro da cidade: Euterpe, Campesina, Estrela Friburguense e Recreio dos Artistas. O distrito de Lumiar possuía duas bandas, a Sociedade Musical Euterpe Lumiarense e o Club Musical Quinze de Novembro, em São Pedro. De todas elas, a Campesina era a mais articulada, lembrando que foi essa sociedade que deu início às obras do primeiro teatro da cidade, o Teatro Victor Hugo, que por questões financeiras foi vendido ainda em construção aos Jordão, que o transformaram em Teatro D. Eugênia.

A maior parte dessas bandas extinguiu-se, exceto a Euterpe e a Campesina, que passaram a servir de manobra política na cidade. Quando um determinado político apoiava uma delas, conseqüentemente o seu adversário apoiaria a outra, e assim se sucedeu continuamente, de forma que as duas bandas remanescentes são até hoje inimigas acirradas.Recusam-se a qualquer aproximação ou parceria e jamais se apresentam conjuntamente em qualquer evento. Quando, em 1992, o Prof. Alexandre Gazé, então Secretário de Educação e Cultura do município, tentou aproximar as duas sociedades musicais para executarem juntas um concerto em comemoração ao aniversário da cidade, não obteve sucesso em sua empreitada. É interessante o argumento utilizado por ambas para recusar: o que as manteve vivas durante todos esses anos foi justamente a animosidade existente entre elas.
Havia entre as bandas competição, o que sempre foi considerado como algo natural entre as sociedades musicais. Nas procissões religiosas, geralmente, eram duas as bandas que se revezavam nos dobrados, e essas ocasiões eram transformadas em palco de demonstração de competência e habilidade musical de uma sobre a outra. Numa determinada procissão, por exemplo, enquanto a Sociedade Recreio dos Artistas tocava uma marcha no início do préstito, antes mesmo que ela terminasse sua apresentação, rompia com um dobrado a Sociedade Estrela Friburguense. Os componentes da primeira, indignados, atracaram-se com os músicos da segunda, ficando todos muito feridos até porque alguns instrumentos eram verdadeiras armas, utilizadas uns contra os outros.

Certa feita, quando as bandas Euterpe e Campesina passavam uma pela outra em frente ao Hotel Salusse, fez a Euterpe um sinal de cortesia pela passagem da Campesina. Essa banda, porém, não parou, como era uso e costume, criando-se um verdadeiro alvoroço na cidade por sua falta de cortesia. O seu presidente, o italiano Elviro Martignoni, teve de vir a público desculpar-se pelo incidente, argumentando não ter notado o sinal de cortesia feito pela Euterpe. Não era aconselhável ferir suscetibilidades.

Em meados do século XX, a Euterpe era considerada a “banda dos pretos”, afirmação que tem certo fundamento, porque ela foi formada no período da escravidão, quando era comum cativos e libertos comporem essas bandas. A Flor da Liberdade, a que já nos referimos, provavelmente era formada por negros. De qualquer forma, ainda que formadas por pessoas das classes populares, o repertório dessas bandas era absolutamente clássico, executando Verdi, Donizetti e Bellini, sendo o dobrado o gênero musical mais tocado, como o Moulin Rouge.
Diferentemente do que ocorre hoje, quando as bandas necessitam de subsídio oficial do município para a manutenção de suas atividades, as do final do século XIX viviam de recursos próprios. Proviam-se da colaboração de seus membros e associados, das apresentações em bailes, festejos particulares, teatros, circos, passeios campestres, casamentos, aniversários, soirées dançantes, doações e leilões promovidos geralmente para a aquisição de necessidades pontuais, como instrumentos ou uniformes.

Bailes, casamentos, aniversários, piqueniques, teatro, circo, soirées dançantes, leilões, procissões, funerais, eventos políticos, homenagens, carnaval ou o passeio banal pelas ruas da cidade. No final de século XIX, não era possível imaginar qualquer forma ou espaço de sociabilidade em Friburgo sem a presença das bandas de música.

RÁDIO CIPÓ, SEMPRE AMIGA


Rodolfo Abud reúne um baú de histórias em suas memórias: vivenciou a formação da Rádio Friburgo, dos clubes de futebol e dos jogos florais em Nova Friburgo. Por mais estaques que possam parecer estes três assuntos, tanto os esportes quanto os jogos florais devem o seu desenvolvimento a um primeiro acontecimento: a criação da Rádio Friburgo, que o vulgo chamava de Rádio Cipó. A Rádio Cipó surgiu em 1946, e foi uma verdadeira revolução na cidade, nos relata Rodolfo Abud em suas memórias. Mas ouvir rádio naquela época não era uma atitude individual como hoje, era coletivizada. Isto ocorria porque quando surgiu o rádio, nem todos poderiam possuir o aparelho. As pessoas que possuíssem o aparelho em casa ainda tinham que pagar uma licença. Caso o fiscal fosse à residência dos possuidores do aparelho de rádio e o indivíduo não apresentasse a licença paga, sofria pesada multa.

Como nem todos o possuíam, a Rádio Cipó colocava alto-falantes em frente à rádio e o povo, sentado nos bancos da praça, parava para ouvir sua programação. Bares e restaurantes investiam nestes aparelhos, pois era um atrativo para clientes. Comércio sem rádio perdia a freguesia. Quem vendeu os primeiros aparelhos de rádio na cidade foi Dante Lívio, na loja A Sinfonia, situada na atual Praça Getúlio Vargas. Ele igualmente também colocava alto-falantes pendurados nas árvores da praça tocando sucessos musicais da época. Mas por que Rádio Cipó? Tinha este nome porque o povo de Friburgo dizia que bastava estender um cipó que a rádio pegava. O Dr. Aloísio gostou da brincadeira e criou o bordão: “Rádio Cipó, sempre amiga.” A rádio funcionava em um sobrado na Praça Getúlio Vargas e formou grandes nomes do rádio, que depois trabalharam na Rádio Nacional e Rádio Globo, como Hugo Rodolfo, que criou “o globo no ar”, Jorginho Abicalil, Edmo Zarif, Moisés, Carlos Rosemberg, Mário Thurler, entre outros. A rádio tinha os programas de auditório onde um grupo regional composto de violão, pandeiro e sanfona acompanhavam os candidatos. Quem era desafinado o cachorro latia. O auditório da rádio lotava. O Sr. Abud nos informa que alguns chegaram a cantar na Rádio Nacional do Rio de Janeiro.

E havia ainda as novelas. Os textos eram do Sr. Aloísio e outros colaboradores. As novelas poderiam durar uma semana ou mesmo um mês. Rodolfo Abud tem histórias divertidas sobre estas novelas. Certa feita, uma das atrizes pediu ao Sr. Aloísio para sair do elenco, pois seu namorado estava muito enciumado, ao que o Sr. Aloísio retrucou: “Minha filha, faça ao menos a novela hoje que a mataremos e ficará tudo bem.” Em certa ocasião, um ator da novela devendo matar um outro personagem, bradou: “Eu vou matá-lo com um tiro”. No entanto, o contra-regra não conseguia acionar a bombinha para simular o tiro do revólver. O ator improvisou: “Não, eu vou é te matar a facada.” Neste instante, a bombinha funcionou e o tiro disparou. Eram situações que programas ao vivo ocasionavam.
A Rádio Cipó ajudou a difundir o futebol na cidade, na voz de Rodolfo Abud, narrando as partidas entre os quase dez times que Friburgo possuía no auge do seu futebol, entre as décadas de 40 e 70. Não havia interferência política, pois era um espaço aberto a todos. A rádio transmitia os comícios e até mesmo as reuniões dos partidos. Foi ainda graças à Rádio Cipó que as trovas se implantaram em Nova Friburgo. A Rádio Cipó, com 64 anos idade, é hoje, a nossa Friburgo AM, que tanto vem servindo à região serrana. Sempre presente no cotidiano da cidade, não foi por acaso que a Rádio Cipó tinha o seguinte bordão: “Rádio Cipó, sempre amiga”.


Fonte: Entrevista com RODOLFO ABUD, nascido em 21 de outubro de 1926.

EDUARDO DAS NEVES: O PALHAÇO NEGRO EM FRIBURGO



Nova Friburgo, no final do século XIX, vivia a sua belle époque. As epidemias freqüentes de febre amarela que a todo verão assolavam o Rio de Janeiro, fazia com que os cariocas migrassem para Friburgo e aí permanecessem até que cessasse a epidemia. Mas o que tem a ver a belle époque com epidemias de febre amarela? Ora, naturalmente migravam para Nova Friburgo os cidadãos cariocas mais abastados, que chegavam a permanecer seis meses na cidade, incrementando a sua vida social. Este público atraía, igualmente, inúmeras companhias teatrais e os melhores circos da época. A importância de Nova Friburgo no circuito dos grandes espetáculos pode ser abalizada pela presença do afamado Circo Brasileiro, que além de artistas nacionais e estrangeiros contava, à época, com um dos maiores artistas: Eduardo das Neves, o palhaço negro, célebre compositor e cantor de modinhas brasileiras. Eduardo Sebastião das Neves, palhaço, poeta, cantor, compositor e violonista, nasceu em 1874 no Rio de Janeiro e morreu na mesma cidade em 11 de novembro de 1919. Trabalhou na Estrada de Ferro Central do Brasil e como soldado do Corpo de Bombeiros, de onde foi expulso por freqüentar fardado rodas boêmias. Em 1895, tornou-se palhaço e cantor, apresentando-se em circos. Era conhecido como Palhaço Negro, Diamante Negro, Dudu das Neves e Crioulo Dudu.

Sua importância foi tamanha para Nova Friburgo que em certa ocasião gerou polêmica. A Câmara Municipal não autorizou que o Circo Brasileiro fosse armado na Praça 15 de Novembro(atual Getúlio Vargas), local onde normalmente se armavam os circos. Foi autorizado somente na Praça do Suspiro. A imprensa denunciou: A Câmara foi pressionada pelo proprietário do teatro, temendo que o circo tirasse o público do Teatro D. Eugênia. Os jornais da época davam grande destaque a cada vez que Eduardo das Neves se apresentava em Friburgo, e curiosamente ressaltavam o fato de ser ele um “palhaço negro". Eduardo das Neves, o palhaço negro, era célebre compositor e cantor de modinhas brasileiras sendo exclusivo da Casa Edison, contratado a partir de 1906. Era considerado o mais popular e influente de todos os primeiros cantores profissionais, compondo modinhas, lundus, recitativos, monólogos, cançonetas, tremeliques, choros e chulas. No prefácio do disco intitulado Trovador da Malandragem, que escreveu em 1902, queixara-se de que muitos duvidavam ser ele o autor das modinhas que cantava, devido à sua condição de negro e origem humilde. Segundo José Ramos Tinhorão uma das razões do sucesso de Eduardo das Neves era a de ter lançado a novidade de compor modinhas e lundus sobre acontecimentos da atualidade, a exemplo de O aumento das passagens, O 5 de novembro, A conquista do ar, essa última canção numa alusão a Santos Dumont. São ainda autorias suas Pegas na chaleira e Pelo buraco.

Ainda segundo Tinhorão, a importância de Eduardo das Neves estava no fato de que, dirigindo-se às camadas heterogêneas, como o povo humilde freqüentador de circo, e o público médio dos teatros, ele ainda estendia sua ação em vários estados brasileiros, viajando com circos e companhias teatrais e espalhando seus discos por todo país. O filho de Eduardo das Neves, o “negro Cândido das Neves”, o Índio, continuou a obra do pai. Juntamente com outros compositores chegariam à fase de expansão do rádio, a partir da década de 30, dando continuidade ao gênero das modinhas que contavam com cantores de veleidades operísticas como Vicente Celestino, Francisco Alves, Orlando Silva e Sílvio Caldas.

Eduardo das Neves, que se apresentava freqüentemente em Friburgo, é provavelmente o autor de um teatro-revista sobre o seu cotidiano intitulado Costumes de Friburgo, ganhando a cidade inclusive uma cançoneta denominada Friburgo na Ponta. O teatro-revista consiste em uma peça com quadros de música, dança, anedotas, alegorias, esquetes, na qual se criticam os fatos mais em evidência da época. Friburgo na Ponta teria hoje como expressão correspondente “Friburgo no auge”. A presença constante de Eduardo das Neves no município e igualmente o título de sua canção, Friburgo na Ponta, são uma prova evidente de que a cidade vivia a sua belle époque ao final do século XIX.

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