FUJAM RAPAZES! O RECRUTAMENTO MILITAR VEM AÍ!


Aviso Importante: vai ser aberto o recrutamento. Previnam-se no sábado, antes do toque de aleluia, não saiam à rua os homens marca gigante...”. Foi assim que o jornal O Friburguense noticiou a possibilidade de um recrutamento em 1893, em Nova Friburgo. Mas por que o alarde quanto ao recrutamento militar? Na realidade, o problema consistia precipuamente nos “braços” para a lavoura que as famílias perdiam em tendo os seus filhos e até maridos recrutados. Logo, quando corria o boato de recrutamento, os filhos dos agricultores escondiam-se nas matas com o auxílio da família, como verdadeiros fugitivos. Desde o período colonial até o Império, o recrutamento para as tropas sempre foi o maior espantalho da população brasileira e a tradição oral ainda conserva em alguns lugares bem viva a lembrança deste temor, nos informa Caio Prado Júnior. Não havia critério algum para o recrutamento, nem sequer organização. Tudo dependia das necessidades do momento e do arbítrio das autoridades. Por ocasião de revoltas e na guerra, como a Guerra do Paraguai(1865-1870), muitos escravos foram cooptados a defender a soberania nacional como soldados de infantaria. Havendo necessidade de soldados, os agentes recrutadores saíam à cata das vítimas, entrando pelas casas, forçando portas e janelas e se dirigiam até as escolas para arregimentar os estudantes. Nem os eclesiásticos se livravam do recrutamento forçado e eram retirados a força de suas paróquias para servir nas Forças Armadas. Quem fosse encontrado pelo recrutador e julgado em condições de tomar as armas era, incontinenti, arrebanhado e levado aos postos. Logo, ao menor sinal de recrutamento, a população masculina desertava dos lugares habitados embrenhando-se no meio do mato. O maior castigo era por o côvado e meio às costas de um brasileiro, isto é, o pano da farda. A elite da época não valorizava a carreira militar, preferindo chefiar as milícias locais, a exemplo da Guarda Nacional, onde recebiam títulos de coronel e armas.



Com a chegada da Família Real em 1808, D. João VI endureceu estabelecendo em 8 anos o tempo de serviço para os voluntários e o de 16 anos para os não voluntários, ou seja, os recrutados à força. No entanto, como o recrutamento desenfreado estava retirando os braços da lavoura, houve uma crise no fornecimento de alimentos às cidades. João VI, por conseguinte, isentou do recrutamento agricultores, condutores de mantimentos, de gado e mineiros. Como os homens trabalhadores e morigerados não poderiam ser arregimentados, optou-se pelos ociosos, já que havia necessidade de homens para os regimentos de Infantaria e Artilharia da Corte. O Decreto n°9 de 1811, ordenava claramente que se recrutassem vagabundos e homens de má conduta, o que para os padrões atuais das Forças Armadas soa como algo extremamente bizarro. D. Pedro I, igualmente esvaziou as prisões cariocas na condição dos criminosos tomarem em armas nos regimentos da Armada, diminuindo ainda o tempo de 8 para 3 anos no intuito de motivar o voluntariado para o Exército. Manteve a proibição de se recrutarem homens morigerados e de não refrescar no recrutamento dos desocupados. Nas ocasiões de recrutamento, as vilas e cidades aproveitavam a solicitação de recrutas para esvaziar as suas cadeias enviando homicidas e vagabundos para servirem na Armada. Mas na prática os recrutadores não respeitavam os trabalhadores, daí a fuga de rapazes dos campos e das oficinas, acoitados pelas famílias, temendo perder sua força de trabalho. Mas no início da década de 1830, as coisas pareciam estar mudando. Localizamos o seguinte ofício dirigido à Câmara Municipal de Nova Friburgo:“...Manda a Regência, em nome do Imperador (...) que a Câmara do município da vila de Nova Friburgo, na expedição das ordens para o recrutamento aos juízes de paz, toda circunspeção para que no número dos recrutados se não admitam homens desprezíveis, mal procedidos e facínoras a fim de se evitarem as cenas de horror de que infelizmente tem sido testemunha esta capital. Rio de Janeiro, 28 de dezembro de 1832”. Pode ser que esse ofício se refira a revolta dos mercenários alemães ocorrida no Rio de Janeiro.



Chegavam os recrutados ao Rio de Janeiro manietados em grupo, mãos amarradas às costas, pés algemados, os mais rebeldes com gargalheiras e a escolta vez por outra baixando o cacete nos mais desaforados. Os escravos nas ruas faziam pilhéria desses igualmente desgraçados. Em 1826, o governo do Ceará colocou 3.000 homens amontoados em uma sumaca com destino à Corte, seminus, e devido à insalubridade da embarcação morreram 553 recrutas. Há um interessante episódio ocorrido em Nova Friburgo por ocasião da Revolução de 1930. De acordo com a tradição oral, no governo de Galdino do Vale Filho, convocou-se rapazes do município para assistir a uma partida de futebol no Campo do Friburgo. Qual nada! O motivo mesmo para pegar na rede o maior número possível de rapazes para servir nas forças legalistas contra os revolucionários. Muitos rapazes levaram para casa o côvado e meio às costas e nunca mais se esqueceram daquela “partida de futebol”. A técnica de recrutamento era a da surpresa e do sigilo. Geralmente ocorria nos dias de festas religiosas, quando a população rural dispersa vinha à vila. Uma armadilha comum era colocar uma banda de música na praça principal do povoado e dar início a uma maviosa retreta. Tão logo a rapaziada se aproximava para saber o motivo da festa, a patrulha escondida caía-lhes em cima e na base do pau e da corda, arrebanhavam os rapazes e os conduzia, a ferros, para os quartéis do Rio de Janeiro. Não fosse trágico o recrutamento no Brasil, pode-se afirmar que seria cômico.



Todas as fotos acima são relativas ao Tiro de Guerra de Nova Friburgo. Acervo do Centro de Documentação Histórica de Nova Friburgo.


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