ENQUANTO O PAU VAI E VEM, FOLGAM-ME AS COSTAS

O dia 20 de novembro foi consagrado como o dia nacional da consciência negra. Muito justo. Mais de três séculos e meio de nossa história sob a égide do trabalho compulsório, a escravidão deixou conseqüências em nossa sociedade que até hoje são sentidas. A escravidão em Friburgo tinha seus arranjos nas instituições da cidade, como na Câmara Municipal, e fazia parte do cotidiano da vila. “Enquanto o pau vai e vem, folgam-me as costas”. Esta expressão surge na Friburgo do século XIX. Em que sentido foi empregada? Poder-se-ia afirmar que foi utilizada no sentido de que durante pouco tempo dava-se um pausa, um refresco, numa determinada situação crítica. Mas o que mais importa e chama a atenção nesta expressão é de como o imaginário das pessoas estava impregnado de situações que remetiam ao cancro da escravidão.

O poder público, através da Câmara Municipal, tinha toda uma estrutura voltada para a questão da escravidão. Havia na Câmara a função de capitão de assalto ou capitão do mato para cada distrito do Termo, em virtude da vasta extensão do território. Ao que parece era uma atividade lucrativa. Há diversos registros de solicitação de provimento para servir-se como capitão do mato. A Câmara adquiria correntes, colares, algemas, anjinhos, cadeados, toda uma parafernália de objetos para apresar os escravos, tudo previsto em orçamento.

Particulares também recebiam pagamento pela prisão de negros fugitivos. Todos buscavam tirar proveito da escravidão. Em Friburgo, até os bagrinhos queriam auferir proventos da situação. Em certa ocasião o fiscal da Câmara acoitou em sua casa, para seu serviço particular, um escravo do libambo, lugar de custódia dos cativos capturados. Indagado pela Câmara, o fiscal declarou que o tinha tirado do libambo para o curar de suas boubas. Alguém acreditaria nesta história? Era uma prática comum na vila acoitar escravos fugitivos para utilizarem os seus serviços.

O clero também fazia uso de escravos. Monsenhor Miranda quando em visita a Friburgo em 1821, trouxe consigo dois soldados de cavalaria, um guia e quatro escravos. Institucionalizada nacionalmente, o reverendo Jacob Joye, padre suíço da Vila, possuía escravos bem assim o reverendo João José Viviand. A guerra justa foi um argumento que a Igreja encontrou para justificar a escravidão no Brasil.
Os escravos faziam parte do cotidiano da vila, mas era proibida sua circulação pelas ruas depois das dez horas da noite. Seus ajuntamentos ocorriam na fonte do suspiro, onde iam buscar água para seus senhores e acabou se transformando em um espaço de sociabilidade dos mesmos. Há uma reclamação na Câmara destes ajuntamentos que incomodava a população, pois segundo eles, os pretos urinavam no local. Portanto, tinham sua circulação e comportamento patrulhados pela elite local, monitoramento este refletido nas posturas municipais. Há referência de maus tratos. A violência contra escravos era tamanha que a Câmara passou a recriminá-las em dado momento, já que gritarias e pancadas nos cativos incomodavam a vizinhança. Continuo na próxima semana.
Fonte: Fundação Pró-Memória de Nova Friburgo.

1 Response to "ENQUANTO O PAU VAI E VEM, FOLGAM-ME AS COSTAS"

Anônimo disse...

nossa que orror e aida tem gente que as vezes fala que trabalha pior que escravos

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