A CIDADE TAUMATURGA

Antes que o amigo leitor tenha o trabalho de ir ao dicionário vou logo dar o verbete do que seja taumaturgo: o que faz milagres. Desde a fundação de Friburgo acorriam a cidade inúmeros indivíduos, vítimas da tuberculose, a peste branca, surgindo nesta ocasião as primeiras pensões, como a do francês Guilherme Salusse, para abrigar estes corpos doentes. A partir de então, grassam na história de Friburgo documentos e relatos que testemunham que a vinda a cidade proporcionava a estes enfermos a cura de sua doença, transformando o vale da pacata vila em um verdadeiro santuário. Se Jerusalém(Israel), Santiago de Compostela(Espanha) e Mont de Saint Michel(França) foram centros de peregrinação na Idade Média, pode-se afirmar que a taumaturga Friburgo foi durante mais de um século, entre a primeira metade do século XIX e igualmente do século XX, um ponto de convergência e peregrinação daqueles que buscavam na salubridade de seu clima a cura de seus males. “O clima e a água desta abençoada terra, dão alento aos vivos e ressuscitam os mortos; pode-se afoitamente dizer....”, vem escrito em uma crônica publicada em O Friburguense, em 1895. O trovador J.G. de Araújo Jorge não disse que do céu se lê as cinco montanhas formarem a palavra “SAÚDE”? Machado de Assis, quando esteve em Friburgo, em 1879, para cuidar da saúde abalada, escreveu: “A mim esse lugar para onde fui cadavérico há dezessete anos, e donde saí gordo(...)há de sempre lembrar com saudades....Nova Friburgo é terra abençoada. Foi aí que, depois de longa moléstia, me refis das carnes perdidas e do ânimo abatido.

Foi devido ao clima de Friburgo e a qualidade de suas águas que o médico napolitano Carlos Éboli instalou o Instituto de Hidroterapia, nos legando o belo prédio em estilo neoclássico, que foi o Hotel Central, anexo ao instituto, hoje o C.N. das Dores. O clima provavelmente foi um fator determinante para a vinda de imigrantes italianos, alemães, portugueses, espanhóis e libaneses a Friburgo no final do Século XIX. A taumaturga cidade pagou, no entanto, o preço da fama da salubridade de seu clima. A Marinha do Império envia para Friburgo marujos acometidos por beribéri, doença que se supunha infecto-contagiosa. Acreditava-se que o clima da cidade proveria a cura destes doentes. Mais adiante, em 1910, a Marinha instalou o Sanatório Naval para a convalescença destes doentes e igualmente dos tuberculosos. Além dos hospitais do Sanatório Naval e Santa Terezinha, Friburgo quase teve um terceiro Hospital de Tuberculosos, que seria na atual sede da UERJ, não ultimando este projeto graças aos protestos da população da cidade.
Como os habitantes de outrora lutaram em Nova Friburgo para manter a fama de sua salubridade, pois se orgulhavam muito dela. Dizia-se à época que Friburgo estava “na ponta” e a imprensa jactava-se do município ser o segundo maior do Estado do Rio, só perdendo para a então capital do país, o Rio de Janeiro. Ao final do século XIX, Nova Friburgo quase foi capital do Estado, perdendo por pouco para Petrópolis. Talvez alguns achem exagerada a afirmação de que Friburgo, à época, era um vale operador de milagres. No entanto, a crônica que segue, uma entre uma centena de relatos, confirma esta assertiva. A crônica “Pérola Esquecida”, publicada no jornal O Nova Friburgo, de 09 de maio de 1937, é significativa e demonstra como Friburgo era vista no imaginário da época como uma cidade taumaturga, se transformando em um centro de convergência de peregrinos doentes:
“....E o coração da gente como que pára para cantar seu hino a Friburgo, como tive ocasião de ouvi-lo o mês passado no pesar de uma moça que descia definitivamente [refere-se a retornar ao Rio de Janeiro] e que muito me impressionou(...)Trazia pálido o semblante e chorava copiosamente, perdida sua alma num soluço comovente e com o qual se despedia de Friburgo! Perguntando um passageiro se havia perdido algum parente, respondeu: Não, eu choro de gratidão, porque volto curada de Friburgo!”
Acervo documental e fotográfico: Centro de Documentação Fundação D.João VI.

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