Yolanda Brugnolo Lívio Barilari Bizi Cavalieri d´Oro é descendente de imigrantes italianos que vieram para Friburgo, no final do século XIX. Conheceremos a vida de sua avó Anita, para entender um pouco do cotidiano destes italianos em Friburgo, na década de 20, do século XX. Anita foi uma guerreira. Viúva aos 24 anos, com três filhos pequenos, Carmem, Elisa e Dante e um na barriga, que morreu ainda bebê, conseguiu vencer todas as dificuldades e criar seus filhos sozinha. O italiano Bonaventura, marido de Anita, tinha uma loja de calçados e gostava muito de beber Chianti e jogar bocha com os patrícios, os amigos italianos Mastrangelo, Perna, Piloto e Caputo. No entanto, em visita a um amigo no Rio de Janeiro, doente com febre amarela, contraiu a doença e faleceu prematuramente. Anita, uma das mulheres mais bonitas da época, loura e pele de alabastro, não quis casar-se outra vez, apesar de não lhe faltar pretendentes. Anita “encostou na máquina de costura” e com esforço organizou um atelier, contratando costureiras e conquistando uma clientela sofisticada. Recorda-se Yolanda que “a Nova Friburgo daquela época era muito sofisticada. A colonização suíça e alemã, a vinda de veranistas franceses, e mesmo aristocratas do Rio de Janeiro, trazia hábitos finos, gostos cultivados. Vovó Anita era uma mulher pobre, mas de fina educação, adquirida nas casas requintadas que freqüentava, primeira como costureira, logo como amiga.”
Anita abrigou em sua casa muitas sobrinhas para livrá-las dos rudes trabalhos da lavoura e igualmente as educou. Todas tinham que trabalhar, sem tugir nem mugir. Aprenderam muito e lhe são gratas mesmo quando recordam a ligeireza da mão da velha Anita, quando distribuía corretivos. Aos poucos, alguns italianos foram se mudando para Friburgo, deixando o trabalho do campo. Yolanda se recorda do delicioso almoço de ovo frito com polenta e mortadela, feitos no fogão de lenha crepitante, em casa de seus parentes italianos. Lembra-se ainda, da época em que inauguraram em Friburgo a Casa d’Itália, onde ouvia palestras sobre Dante, Sanzio, Cellini, Leonardo da Vinci e bem assim dos bailes do Club Dopo Lavoro. Numa parte do salão, a moçada sambava e fazia cordões, enquanto que no outro, a “italianada velha”, os Mastrangelo, Caputo, Perna, Massa e Bianchini, dançavam alegremente a tarantela.
Como havia muitos tuberculosos na cidade, sua avó Anita abriu uma pensão para atender a estes doentes que vinham se curar em Friburgo. Bom negócio e clientela certa, pois chegavam frequentemente centenas de tuberculosos a cada ano em Friburgo, pois o clima lhes era favorável à cura. Anita possuía uma série de cuidados especiais com seus hóspedes doentes e segurava as bacias para as hemoptises dos tísicos, todos muitos “fracos de peito”. Yolanda se recorda de sua avó dando ao doente uma gema crua numa colher de sopa para criar cor, seguida de um cálice de vinho do Porto ou um escalda pés capaz de afugentar qualquer resfriado teimoso. Chegava o domingo, dia da sacrossanta macarronada. Desde cedinho, sua avó mesmo pronta para a missa, usava um avental de algodão alvejado para preparar a massa de trigo e ovos. Enquanto Anita ia a missa, a massa ficava esticada na mesa, secando, e o delicioso molho apurando no fogão de lenha. A pasta era servida numa travessa de porcelana, acompanhada por uma dourada carne assada, cortada em fatias com batatas em sua volta.
Finalmente, se recorda de sua avó vigiando-a pela janela, enquanto brincava na rua, pois “quem toma conta, dá conta”. Yolanda, na sua velhice, se surpreendia consigo mesma cantando velhas cantigas italianas e em suas memórias, disse que parecia ainda sentir o cheiro dos rapapés, pudins, bolos, queijos, biscoitinhos de polvilho, licores de jabuticaba e vinhos de laranja, tudo feito pelas mãos mágicas de sua avó Anita.
Fonte: Baseado nas memórias de Yolanda Brugnolo Lívio Barilari Bizi Cavalieri d´Oro(1922-2007)
1 Response to "O cotidiano de uma típica família italiana em Nova Friburgo"
Janaína,
Tentando conhecer um pouco mais sobre Nova Friburgo com os textos postados por voce, fiquei eliz ao encontrar essa imagem da Tarantella do Henrique Barnardelli!!!
Parabéns pelo blog! Recomendo o seu livro para todos os meus alunos de História da Arte e Patrimônio do CEFET/RJ-UnED Nova Friburgo. Abçs, Camila Dazzi.
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