LAR-ESCOLA E AS MÃES ESPIRITUAIS



No dia do professor nada mais pertinente do que falar sobre a educação no passado. Para tanto, seguem as memórias de algumas senhorinhas que nasceram na década de vinte do século passado. Em princípios do século XX, no currículo das alunas do curso “Normal” havia aulas de português, matemática, geografia nacional, história do Brasil e geral, história sagrada, catecismo, pedagogia, puericultura, psicologia, sociologia, moral e civismo, trabalhos manuais, higiene escolar e economia doméstica. Aprenderam canto orfeônico, tinham aulas de ginástica e até mesmo de teatro. Boa parte das crianças de classes abastadas em Nova Friburgo, no século passado, iniciava o curso primário nas próprias residências das professoras. O ensino era ministrado normalmente por notórias educadoras da cidade, a exemplo do que foi a Dona Helena Coutinho, a italiana Ítala Massa, D. Ermínia, D. Cely Ennes, entre outras, intituladas à época de “mães espirituais”. Eram mistas essas escolinhas e a atitude de abrir uma escola na própria residência era apenas de professoras. Os homens educadores não tinham tais práticas. A educação era território feminino. As salas de aula eram extensões de seu lar.
Separava-se um cômodo da casa, mobiliavam com uma mesa comprida e bancos coletivos onde todos compartilhavam as lições. Na escolinha de D. Helena, improvisava-se com bancos de madeira e caixotes de banha que funcionavam como carteiras. A professora ensinava a todos conjuntamente, desde os alunos que aprendiam as primeiras letras até a quarta ou quinta série. Iniciavam-se os estudos com cinco anos de idade. Não havia, como hoje, jardim de infância ou maternal. As matérias como geografia, matemática e português eram dadas todas numa só aula. Não eram separadas. A tabuada era de Galhardo. Idiomas somente no ginásio. Algumas professoras, mas muito raro, no último ano do primário davam noções de francês.

Depois do primário, o ginásio. Fazia-se então o exame de admissão para a nova fase. A idade mínima para fazer a admissão era de 11 anos. Era um rito de passagem entre a educação informal, na casa da professora, para um estabelecimento formal de educação. A elite de Friburgo tinha como opção o Colégio N.S.das Dores, o Chateau, como era chamado o Anchieta e o Colégio Modelo. O N.S.das Dores, na década de quarenta, ainda era em regime de internato para moças. Paradoxalmente, muitas meninas, mesmo residindo no município, foram internas do N.S.das Dores. O Chateau era somente para meninos da elite e o Colégio Modelo misto, nesse último estudando o que corresponderia a uma classe média. No lugar dos trabalhos manuais como o bordado, aprendido no primário, ensinavam-se no ginásio as línguas estrangeiras como o latim, inglês e francês. Terminava-se o ginásio, que durava quatro anos, com 15 anos, aproximadamente. Escolhia-se entre o normal, científico, clássico e técnico de contabilidade. Esse último, ainda que destinado aos rapazes, tivera muitas moças na turma que eram cooptadas para trabalhar nos escritórios das recém instaladas indústrias em Friburgo.

Uma professora àquela época era muito respeitada e ganhava um bom salário. A historiadora Guacira Louro em seu trabalho “Mulheres na sala de aula” nos informa que a imagem de “professora solteirona” não passava de uma das representações fabricadas no magistério feminino, muito adequada para justificar a completa entrega das mulheres à atividade docente, esquecendo-se de si, reforçando o caráter de doação para desprofissionalizar a atividade. Mas em Nova Friburgo, apesar do prestígio do magistério e do bom salário, muitas ficaram “solteironas”. E por que? Explicam as entrevistadas que muitos rapazes não quiseram casar-se com professoras para não serem rotulados, devido a importância delas na sociedade, de “marido da professora”.
Entrevistadas: Maria Corrêa de Souza(1920), Maria Luiza Braune(1929), Nelie da Costa(1925) e Leyla da Silva Melo(1937).

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